Original Fake






Deixámos de ser genuínos.
Já há poucas coisas puras o suficiente. 
Vivemos numa sociedade assente em tudo, menos naquilo que acreditamos que ela seja. 
Sobrevivemos num estado de direito, corrompido pela ganância, interesse e poder. 
Respiramos as tendências da moda, usamos cílios postiços, seios implantados, lábios e sobrancelhas tatuados. 
Exibimos traseiros fabulosos e ancas a combinar. Esticamos os olhos e retocamos o nariz, fazemos depilação definitiva e as nails. Só compramos carros eléctricos e produtos biológicos.
Adoramos ser originais, com novos alimentos, com as novas apps e com a internet a exigir sempre mais.
Vem tudo ter a casa, nem precisamos levantar o rabo do sofá, a não ser para a abrir a porta e passar o cartão, sempre com contact less, porque está a dar um jeitão.
Chega o açaí e a framboesa, a carne que não é bem carne, nem é bem planta. Fica ali a meio termo.
Vem o livro ou o cd, as chaves ou as compras que não nos apeteceu fazer, com iogurtes sem leite, a aveia e a linhaça. 
Devoramos e publicamos stories no Insta, como se, o que por lá aparece, nos incluí-se nesse universo sempre em movimento. 
Partilhamos opiniões no Face, sem verificar. Só mesmo para animar a malta, com mais um boato ou alguma ideologia radical, mesmo a calhar para impor a nossa opinião. Porque todos somos reis absolutistas, das nossas redes sociais.
O que é verdade agora, já poderá ser bem diferente lá pela hora do lanche.
Hoje é verde, amanhã já é azul e afinal é para retirar condecoração ao senhor doutor. Foi apanhado pela justiça, coitadinho. Até era boa pessoa.
Ontem era ministro, amanhã ia ter um cargo não sei onde, hoje, pois hoje já não vai dar. Mas talvez daqui a uns anos possa dar novamente.
Desapareceu dinheiro de donativos, desapareceram e reapareceram as armas de Tancos, o Ricardo Salgado ainda vive em Cascais e vai à missa numa capela privada. Dos donativos ninguém fala, das armas acho que quem se lixa é sempre o mexilhão e o DDT terá de cair, supostamente.
O virús estava na China, não chegava cá. Ahh afinal chegou. Agora vamos lixar-vos a vida, porque não conseguimos reagir a tempo de nos proteger. 
Máscara, sim. Lava as mãos. Máscara, não. E continua tudo igual. Nada se sabe, sobre nada.
Ontem íamos ficar todos bem e nos entretanto, ninguém sabe bem como vai ficar.
Navegamos à vista, sem conseguir ver terra, mas o que interessa é o que se mostra aos outros.
Sofremos dificuldades financeiras, mas não pedimos ajuda. Temos ansiedade e depressão, mas admitir é sinal de fraqueza. Fechámo-nos sob a capa da aparência, onde o arco íris aparece todos os dias.
E assim nos tornámos, naquilo que a sociedade quer que sejamos. 
Felizes, a consumir, a contribuir e a não sair fora do rebanho.
Falsos na aparência, falsos nos afetos, falsos no caráter. Falsos.
Somos uma imitação barata de uma sociedade, em nada original.





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